quarta-feira, 6 de junho de 2012

Repasse do II° Encontro de Parques de Montanha do Brasil

Texto redigido pelo montanhista Sandro Souza, membro da Associação Capixaba de Escalada (ACE).
Repasse do II° Encontro de Parques de Montanha do Brasil.
(Sandro Souza: Urca, Rio de Janeiro, 26 e 27 de Abril de 2012)
 
Contexto:

A 1ª Semana Brasileira de Montanhismo comemorou os Cem anos de montanhismo no Brasil, que tomou como referência a data da primeira ascensão ao Dedo de Deus. O evento foi constituído de vários outros eventos, entre eles a já tradicional abertura de temporada no Rio, o II° Congresso Brasileiro de Montanhismo e Escalada, e o II° Encontro de Parques de Montanha do Brasil.

Representatividade:

O encontro de Parques contou com a participação do Diretor de Criação e Manejo de Unidades de Conservação (UCs) do ICMBio (Pedro da Cunha Menezes), o Coordenador de Uso Público e Negócios do ICMBio (Ernesto Viveiros de Castro) e os Gestores de diversos Parques  Nacionais (Floresta da Tijuca, Serra dos Órgãos, Chapada dos Veadeiros, Pico da Neblina, ...). Na esfera estadual, diretores e gestores de parques dos estados do RJ, PR, SP, RS e ES estiveram presentes. 
Entre eles André Ilha do INEA, Sergio Poyares do PE Três Picos, representantes do PE Marumbi, e André Tebaldi, o Coordenador de áreas protegidas do IEMA. A sociedade civil se fez representar pela CBME e seus principais afiliados como a FEMERJ, FEMEMG, e clubes e associações, inclusive a ACE.

Seguem alguns tópicos abordados durante o encontro de parques.
 
26/04

Abertura:

Mesa composta por Silverio Nery (CBME), Pedro da Cunha Menezes (ICMBio) e André Ilha (INEA - RJ)

Pedro – Anunciou o novo alinhamento do ICMBio  no sentido de não tolher a qualidade da vivência durante as visitas nos Parques. Pra isso, será extinta a obrigatoriedade do uso de guias (condutores, monitores...) nos parques nacionais. Salvo raras exceções onde se justifique devido à extrema fragilidade do patrimônio natural ou arqueológico.

André Ilha – Ressaltou que as pressões sobre o meio ambiente, à exemplo do código florestal e o desmantelamento do IBAMA, tendem a se acirrar e neste momento aqueles comprometidos com o meio ambiente devem se unir. Os gestores de Parques devem buscar mais aliados e os montanhistas são aliados muito engajados. “É necessário cooptar aliados diante das pressões iminentes.”

Os gestores devem fazer uma conta de soma e subtração ao comparar os benefícios de permitir o uso público cultivando uma militância ambiental por parte dos visitantes, contra eventuais malefícios causados pelo impacto da visitação.

Palestra do André Ilha:

- Diferenciação de Turismo e Uso Público. O Uso público é mais amplo. Exemplo: esportivo, religioso, artístico, científico, simples lazer, turístico... E deve-se atender às expectativas de todos os públicos.

- Não é preciso que exista um plano de manejo (documento detalhado, caro e demorado) para que seja manejado o uso público.

- Decreto sobre as UCs estaduais (RJ) que diz que o uso público é permitido a menos que explicita e justificadamente se diga o contrário.

- A contratação dos serviços concedidos é sempre opcional para que não haja ressentimento dos que não podem pagar, nem daqueles que não desejam uma babá para tangê-los.

- Diferenciou os tipos de trilhas atribuindo diferentes graus de intervenção para cada uma: Trilhas de turismo (bem aberta, farta sinalização e intervenções como rampas, cabos e escadas); Trilhas de montanhismo (alguma sinalização, intervenções só para manter a trilha); Trilhas de montanhismo remoto (sem intervenções).

- Metodologia para abordar o uso público nos planos de manejo: Realização de seminários de mínimo impacto com a participação de gestores, pesquisadores e usuários para formar pacto para zoneamento e previsão de atividades. O resultado é transplantado inteiramente para dentro do plano de manejo.

Palestra do Ernesto:

- Fim do conceito de parque aberto e parque fechado.

- Adoção de uma gradação onde “0” é ainda fechado (um caso apenas no Brasil) e “5” é aberto e plenamente estruturado.

- Os parques subirão nessa escala visando:
  • Qualificar e diversificar a oferta de atividades para a visitação (as atividades não precisão estar previstas nos planos de manejo para serem permitidas).
  • Estruturar as UCs, lembrando que estrutura adequada não é a máxima.
  • Formalizar, ampliar e qualificar serviços de apoio a visitação. A prioridade não é a renda e sim fornecer o apoio.
- De acordo com a IN 08/2008 (http://www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/o-que-somos/in082008.pdf), Estimular o uso de guias locais, mas não tornar seu uso obrigatório.

- “O visitante deve entrar informado e sair satisfeito.”

Palestra do Delson de Queiroz (FEMERJ):

- Apresentou um PDF com Princípios e Valores do montanhismo, e desenvolveu o tema.
 
Palestra do Brady Robinson(Acess Fund):

- Falou do exemplo do parque de Yosemit. Apresentou dados básicos com história, extensão, biota, geologia, atrativos...

- Lá, 94% da área é “Wild”, mas em toda ela é permitida visitação. Não existe área intangível como aqui. Na prática a maioria dos visitantes fica perto das estradas, campings e demais estruturas.

- Problema com os conservacionistas estrito censo como a ONG The Nature Conservancy, que se posiciona contra a permanência de pessoas nos parques em nome da conservação. A ONG é constituída pela velha guarda dos ambientalistas com conceitos já ultrapassados.

- Os montanhistas são voluntários para diversos trabalhos nos parques. E por experiência dele, um montanhista vale por três voluntários genéricos, devido à conjunção de fatores como maior envolvimento na causa, maior capacidade técnica e força física.

Palestra do Esteban Degregori (Acesso Argentino):

- Usou o exemplo do Parque Nacional Los Glaciares onde fica Chaltén e a cadeia de montanhas do cerro Torre e Cerro Fitz Roy.

- Todo o acesso é permitido, sendo necessário apenas o registro. A responsabilidade é baseada no indivíduo.

Debates:

- Assuntos administrativos como parcerias para gestão de parques. Permissão, autorização, concessão e parcerias público-privadas.

27/04

Palestra do Sergio Poyares (P.E. Três Picos - INEA):

- Dados base /atrativos / Acesso permitido a princípio/ Informações sobre riscos através de placas bem posicionadas (alternativa diante da inviabilidade de se cobrar a assinatura do termo de reconhecimento de risco)/Como foi o seminário de mínimo Impacto.

Palestra do André Tebaldi (Coord. de áreas protegidas IEMA):

- Dados base /Situação de acesso proibido às montanhas/ Intenção de ampliar o uso público.
Palestra do Leonardo Boquimpani (P.N. Serra dos Órgãos):

- Dados base /Uso e intervenções variadas em trilhas / Adoção do termo de reconhecimento de risco pelos visitantes/ sistema de ingresso on-line.

Palestra do Luis Monteiro (Associação Mineira de Escalada):

- Caso da luta pela reabertura da Lapinha (Parque Estadual do Sumidouro), diálogo com IEF –MG, acordo atual e anúncio de maior abertura prevista.

- Construção de uma proposta estadual valida para todos os parques.

Palestra do Harvey Schlenker (IAP - PR):

- Panorama das áreas protegidas do Paraná. Existem 68 UCs, 45 de proteção integral, sendo 29 abertas para visitação.

- Principalmente no Parque Estadual do Marumbi, é adotado um detalhado cadastro de visitantes com o objetivo de facilitar eventuais resgates.  Este parque sedia o principal grupo de resgate autônomo do Brasil. O COSMO.

- Exemplo da travessia do P. E. da Baitaca onde fica o Anhangava, importante local de escalada. Em 2000 não havia estrutura alguma e eram freqüentes os assaltos, mesmo assim cerca de 1.000 visitantes faziam a travessia por ano. Após a revitalização de uma portaria e estímulo a visitação, hoje são 17.000 visitantes por ano e nenhum assalto nem crime ambiental.

Debate:

- André Tebaldi: “Como fica a questão da responsabilidade nos casos de acidentes dentro de parques?”

Para esta resposta, várias pessoas contribuíram e o resumo está aí:

- Diferenciação inicial dos casos evidentes de responsabilização do Parque como quando ocorre um acidente por falha em uma estrutura (ponte, mirante, telhado...).

- Não existe precedente jurídico (jurisprudência) para embasar essa questão, mas a tendência do entendimento do jurídico é de que a responsabilidade é de cada indivíduo. Fizeram observação sobre a tendência latina ao paternalismo onde o estado age como pai dos cidadãos irresponsáveis, em contraste à abordagem não latina onde o individuo deve se responsabilizar pelos seus atos com menor intervenção do estado.

- Nos casos de acidentes onde o visitante está acompanhado de um guia do parque, aí sim ocorre responsabilização!

- Qualquer pessoa pode processar qualquer um por qualquer coisa, mas isso não quer dizer que ocorrerá condenação. Não há um caso sequer de condenação de um gestor de parque por causa de um acidente. E raros são os processos.

- A adoção de um seguro embutido no preço do ingresso pode ser uma alternativa para aliviar o lado dos gestores.

- Os parques não podem ser imputados pela falta de estrutura já que o risco muitas vezes é justamente o atrativo. Por exemplo, não é razoável colocar corrimão na travessia Petrópolis – Teresópolis.

- Foi unanimidade que se devem alertar os visitantes ostensivamente e exageradamente sobre os riscos dos ambientes naturais. Para efetivamente avisar os mais ingênuos e para resguardar os gestores dos parques.

- Foi abordada a questão fundamental de que as pessoas têm o direito ao risco.

Um desfecho muito significativo foi o convencimento destas idéias por parte da equipe do IEMA, com o acordo de que mudanças seriam encaminhadas no ES e que a CBME diretamente e através da ACE irá ajudar a coordenação de áreas protegidas na argumentação em prol da abertura dos parques a ser apresentado para a presidência do IEMA.
 

Yosemite Range of Light